O tema deste mês do projeto Mães no Canadá é perfeito para o que estamos vivendo no Canadá inteiro: volta às aulas. Isso porque o início do ano letivo aqui no Canadá começa mês que vem, um dia depois do feriado de Labour Day (que este ano cai no dia 7 de Setembro). Portanto, teoricamente, dia 8 de Setembro seria o dia de deixar as crianças na escola… mas a pandemia veio para mudar tudo isso e tirar esta, digamos, tranquilidade em ter nossos filhos aprendendo e interagindo socialmente com outras crianças e professores.
O coronavírus foi decretado pandemia dia 11 de março de 2020 e desde então tudo que estávamos acostumados a fazer acabou mudando. Isso porque a doença é altamente transmissível e a vida em sociedade acaba tornando esta transmissão mais fácil. Em epidemiologia e saúde pública os especialistas costumam falar dos “3 Cs” quando o assunto é contágio: closed spaces, crowded places e contact (em português, espaços fechados, lugares lotados e contato). E é exatamente isso que acaba pegando quando o assunto é escola, porque as turmas aqui tem 30 alunos, em espaços pequenos e há contato. E por mais que você tenha regras para evitar isso, na prática não é fácil esperar que 30 crianças pequenas usem máscara, lavem as mãos corretamente, tussam sem proteger e mantenham o distanciamento social necessário. Simplesmente não é possível.
Desde 13 de março de 2020 as escolas de Ontário estão sem aulas. Inicialmente esta pausa era para ser de 3 semanas – incluindo uma de March Break. Várias extensões foram acontecendo até que eles decidiram que os alunos não teriam mais aulas presenciais no ano letivo de 2019-2020. Porém, foi decretado no início de agosto as seguintes regras para o ano letivo de 2020-2021 em Ontário (leia mais aqui):
- Retorno escolar voluntário: o retorno ou não dos alunos para o ambiente escolar será escolha dos pais. Para os pais que optarem por não mandar seus filhos de volta à escola, os conselhos escolares das cidades devem estar preparados para oferecer educação a distância (i.e. virtual). Esta regra estará em vigor enquanto as circunstâncias de saúde pública exigirem uma oferta educacional adaptada (ou, em outras palavras, enquanto o vírus estiver por ai).
- Alunos do ensino elementar – JK (jardim de infância) até 8ª série, incluindo aqueles em educação especial e programas de imersão em francês e francês estendido – voltarão à escola em tempo integral, cinco dias por semana, em turmas como em qualquer outro ano (i.e. com o mesmo número de alunos). A diferença é que estes alunos estarão no mesmo grupo o dia inteiro, incluindo recessos e almoço.
- Alunos do ensino secundário (nona série em diante) terão um modelo adaptado: os alunos frequentarão a escola todos os dias, em turmas menores de aproximadamente 15 alunos, manhã ou tarde, continuando o aprendizado em casa na outra metade do dia. As escolas irão operar em um programação do quadmester.
- Os alunos do JK à 3ª série serão incentivados, mas não obrigados a usar máscaras. Os outros alunos deverão usar máscaras não médicas ou de tecido / coberturas faciais em ambientes internos, nas propriedades da escola, incluindo corredores e salas de aula.
Confesso que essa decisão me pegou de surpresa: eu não imaginava que as escolas iriam abrir com o mesmo número de alunos e todos os dias, mesmo que com todos os procedimentos de segurança que obviamente serão tomados. E ai, antes mesmo de eu começar a pensar como faríamos com o Thomas – nosso filho mais velho que tem 4,5 anos e irá para o Senior Kindergarten – eu comecei a pesquisar e tentar entender o porquê desta decisão. Comecei a ler sobre outros países – como Finlândia e Dinamarca – que já abriram suas escolas e, tiveram casos e até outbreaks, mas nada além do esperado. Digamos que alguns países tiveram sucesso em abrir suas escolas há meses atrás – quando se sabia menos sobre a doença – e a maioria dos casos aconteceu em alunos mais velhos.
Como sempre – em tudo na minha vida – antes de fazer a escolha se o Thomas iria voltar ou não para a escola eu levei em consideração alguns fatores, e resolvi listar todos eles aqui neste texto:
- A condição de saúde do meu filho: Thomas é um menino saudável: come bem, quase nunca fica doente (consigo contar em uma mão o número de vezes que ele teve febre na vida) e não tem nenhuma comorbidade ou problema de saúde que faça com ele seja considerado parte do grupo de risco.
- A nossa condição de saúde: também levei em consideração a nossa condição de saúde, porque isso é importante. Não basta a criança ser saudável porque se algum de nós tivesse alguma comorbidade ele poderia trazer a doença para casa e todos pegaríamos, então temos que ver este ponto. Aqui somos todos saudáveis e não somos considerados do grupo de risco. Também não temos a família por perto e os meninos não tem contato físico com os avós (que moram no Brasil).
- A experiência com o home-school: de março até final de junho eu fui a professora do Thomas. Na verdade, nem sei se este é o termo certo de usar, mas fui eu que estive ao lado dele o incentivando a fazer as atividades, brigando quando ele não prestava atenção e aplaudindo seu esforço. Era uma média de 2 horas por dia e não foi fácil. Eu sou muito orgulhosa de ter levado esta tarefa a sério, mas foi difícil conciliar tudo. A experiência foi boa, mas não é algo que eu queira continuar fazendo. Claro que eu sei que a educação virtual que tivemos inicialmente foi feita às pressas e que agora os professores estão tendo mais tendo para estruturá-la, mas eu realmente não me sinto 100% capacitada a ensinar ao meu filho tudo que ele precisa ou da maneira mais correta.
- As necessidades de desenvolvimento da sua criança: este é um ponto muito importante, que muito tem se falado. O desenvolvimento social e psicológico do seu filho tem que ser levado em consideração nesta decisão. Ainda, especialistas falam que crianças que tem ansiedade, depressão ou problemas de aprendizagem terão cada vez mais dificuldade para voltar à escola quanto mais tempo ficarem em casa. Thomas é um menino super sociável, que fala com todo mundo na rua, é feliz e aprende super rápido. É daqueles que, de dentro do nosso carro, fala com a pessoa do carro do lado perguntando sobre o carro dele, nome e tudo mais. Eu adoro essa parte da personalidade dele e sei que muito disso veio de mim, que sou extremamente sociável. Gostou de ficar em casa mas pergunta sobre a escola e os amigos. O Thomas começou a ter alguns comportamentos diferentes e, digamos, questionáveis nestes meses em casa e acho que em parte devido a esta falta de socialização.
- Baixa taxa de transmissão na comunidade é a chave: se a doença não estiver na sua cidade ou no seu bairro as chances dela chegar na escola que seu filho for estudar são muito baixas. A cidade de Toronto disponibiliza um mapa com todos os casos de coronavírus por bairro – este aqui, assim conseguimos saber se há algum outbreak onde estamos. Claro que nada é 100% mas este pode ser um começo. O número de casos da doença em Toronto está bem baixo – 16 casos no dia que escrevo este post – e isso nos deixa mais confiantes com a nossa decisão.
- Como seu filho irá para a escola: você tem que levar ele de transporte público, ele irá de ônibus escolar ou você mora perto da escola e poderá levar ele de carro ou a pé? Este é um ponto importante também, que obviamente impacta na decisão. A escola do Thomas é relativamente perto e podemos ir a pé ou de carro.
- Flexibilidade no trabalho quando algum caso aparecer na escola ou algum sintoma surgir: reparem aqui que eu escrevi quando e não se. Isso porque segundo especialistas haverão casos na escola, não há como negar. E os sintomas comuns da doença irão aparecer, até porque estas crianças ficaram muitos meses em casa e não tiveram contato com outros vírus que dão sintomas semelhantes. Eu vejo isso como quando colocamos nossos filhos na creche e eles passam um mês inteiro doente, com virose, gripe e febre. Ter o apoio do seu chefe dentro deste contexto é importante, especialmente se você não estiver trabalhando de casa (como será meu caso). Vale falar aqui que será considerado outbreak quando dois casos com uma ligação forem encontrados em uma escola.
- Comprometimento com a segurança da comunidade: eu já presenciei algumas situações chatas na creche dos meninos, como crianças com hand, foot and mouth disease que os pais mandaram para a escola como se “nada tivesse acontecido” e esta criança ter infectado outras crianças, incluindo meu filho (eu sei disso porque eu questionei a mãe e ela disse que era alergia). Acho que se estamos pensando em levar nossos filhos temos que checar os sintomas diariamente: perguntar como eles estão se sentindo, medir febre (com termômetro) e checar as fezes. Pode parecer neurose mas isso é algo muito importante. Você sabia que em crianças os principais sintomas não são os respiratórios? Estudos mostram que muitas pessoas com a doença apresentaram sintomas gastrointestinais, incluindo náuseas, vômitos e diarréia, principalmente as crianças. Então ao decidir mandar seu filho para a escola você tem que se comprometer a manter ele em casa quando ele não estiver 100%, para talvez esperar alguns dias e ver o que ele tem e evitar um outbreak. Acho que não mandar esta criança é MUITo melhor do que deixá-lo esperando nos isolation spaces que o governo está propondo para crianças que apresentam sintomas durante a escola.
Levando tudo isso em consideração e conversando muito entre nós – incluindo Thomas – nós concluímos que ele irá sim voltar para a escola em setembro. Estamos concientes da nossa escolha e sabemos dos riscos. Li muitos estudos e vi que a contaminação das crianças geralmente se dá geralmente em casa e não na escola (leia mais aqui e aqui). Colocamos na balança os prós e contras e achamos que ela “pende” muito mais para o lado de mandá-lo para a escola. Eu realmente acredito que quando todas as práticas de cuidado forem colocadas em prática, mesmo que uma seja falha, haverá outra que irá ser efetiva. Não posso dizer que estamos 100% tranquilos com a decisão mas sinto que fizemos a escolha correta. E obviamente estarei acompanhando de perto o número de casos no país, cidade e no nosso bairro, e caso haja algum outbreak ou os casos aumentarem poderemos mudar nossa opinião.
Espero que tenham gostado do tema e que levem em consideração todos estes fatores para decidirem sobre enviar seus filhos ou não para a escola. Eu sinceramente acho que não há certo ou errado e vai além de uma simples escolha. Por fim, não deixem de visitar as redes sociais das outras mães brasileiras que moram no Canadá para saber o que elas tem a dizer sobre o assunto.
Alessandra (Bathurst, NB) | Canadiando
Beatriz (Vancouver, BC) | Biba Cria
Carol (Mississauga, ON) | Minha Neve e Cia
Danielle (Newmarket, ON) | Vidal no Norte
Livi (Toronto, ON) | Baianos no Pólo Norte
Mariana (Calgary, AB) | De Bem Com a Vida
Musa (Toronto, ON) | Mamãe Musa
Nayara (East Gwillimbury, ON) | My Family no Canada
Fonte da foto: School photo created by Freepik
Também pesquilei e li muito antes de tomar uma decisão. As minhas também irão para a escola!